domingo, 5 de abril de 2015

Você conhece a origem da Páscoa?

Data ganhou novo significado para os cristãos

“Pela fé celebrou a páscoa e a aspersão do sangue, para que o destruidor dos primogênitos lhes não tocasse.” Hebreus 11.28
Para os cristãos, a Páscoa é a celebração da ressurreição de Jesus, comemorada no fim do primeiro quadrimestre de cada ano. Na mesma época, os judeus comemoram a sua Páscoa, o Pessach – ou Passover, para as culturas anglófonas. É comum muita gente pensar que a festa celebra a passagem dos hebreus pelo deserto rumo à Terra Prometida, como narrado em Êxodo. Porém, o verdadeiro significado da data é lembrar a passagem bíblica em que, em uma das pragas infligidas contra o Egito, Deus envia um anjo que mataria todos os primogênitos da região, mas pouparia os das famílias judias que marcassem as portas de suas casas com sangue de um cordeiro sacrificado (ilustração acima). A ordem divina previa que o fato fosse comemorado após aquele ano, para sempre (Êxodo 12.12-14).
A confusão é compreensível, pois, logo após, vêm os 7 dias da Festa dos Pães Ázimos (Chag HaMatzot, no hebraico) – essa sim para comemorar a saída do Egito para a liberdade. Por serem muito próximas, as datas passaram a ser comemoradas quase como uma só, compondo o Pessach e seus preparativos.
Conforme exposto em Êxodo, antes da décima praga egípcia – a morte dos primogênitos –, Moisés foi instruído por Deus a mandar cada família hebreia sacrificar um cordeiro, usando seu sangue para marcar os umbrais das portas de suas casas. Nos lares marcados, o anjo executor passaria sem entrar para matar os primogênitos dos humanos e dos animais da propriedade. Daí a ideia de “passagem” no nome da festa – a mesma do inglês Passover: “passar sobre”, dando a mensagem de “passar direto”.
Chegada a noite anunciada, a família cearia, comendo a carne do cordeiro com pães ázimos (feitos sem fermento) e ervas amargas. O costume se manteve por muitas eras, adaptados hoje à vida moderna das famílias dos judeus.
O fermento tem uma conotação de pecado, mas a ausência dele no pão também tem um significado prático: a pressa. A fermentação da massa leva certo tempo (às vezes de um dia para o outro), e Deus já estava preparando seu povo para a vida itinerante no deserto, em que tempo para os afazeres diários seria algo raro, bem contado. Uma massa sem fermento não precisaria do tempo da levedação, e poderia ser rapidamente assada.
Preparativos
Para a Páscoa judaica, os preparativos são muitos desde os tempos neotestamentários, quando a festa, junto com a dos Pães Ázimos, tornou-se uma grande celebração da primavera do Hemisfério Norte, comemorando também as colheitas. As estradas e entradas das cidades eram consertadas, pois era comum que as famílias se reunissem e muita gente viajasse. As casas também recebiam os mesmos cuidados, pois receberiam muitos hóspedes. Os utensílios de cozinha eram minuciosamente limpos, ou mesmo comprados novos. Hoje, há famílias que têm louças e pratarias especiais para a data.
As pessoas vestiam suas melhores roupas e se preparavam como se fossem sair para uma viagem – mais uma alusão ao êxodo que aconteceria pouco depois no acontecimento original.
O fermento era excluído da dieta nos dias da festa, e não devia haver nem um pouco dele em qualquer parte da casa, após rigorosa inspeção do chefe de família. Carneiros ou cabritos eram comprados e levados ao templo (como também era feito antes, no Tabernáculo) para sacrifício, geralmente um animal para cada 10 ou 12 pessoas.  A gordura era queimada, o sangue oferecido no altar e as carcaças limpas eram penduradas, esperando que as famílias que as levaram fossem buscá-las, levá-las para casa e assá-las em espeto feito com madeira de romãzeira, para compor a ceia pascal – o Sêder. Até hoje, faz parte do cardápio o charoseth, uma espécie de chutney, de sabor picante e bem ativo, comido com a carne (sempre e somente assada) do carneiro e os pães. Ovos cozidos também fazem parte do cardápio, o que explica a presença de seus similares em chocolate na cultura atual.

No Sêder (foto ao lado), cada alimento segue um simbolismo. Prepara-se a mesa da seguinte forma:
- No centro de uma bandeja são colocados três pães ázimos (ou asmos), que representam os três grupos de judeus: Cohanim, Leviim e Israel;
- O Zeroá, um pedaço de osso do cordeiro ou cabrito, que se coloca na parte superior, à direita da bandeja, e simboliza o poder com que Deus tirou os hebreus do Egito, além do próprio cordeiro pascal sacrificado no Templo;
- O Betsá, um ovo cozido, na parte superior à esquerda da bandeja, uma lembrança do sacrifício que se oferecia em cada festividade (e outro simbolismo: quanto mais se cozinha um ovo, mais duro se torna, uma alusão ao povo judeu: quanto mais é oprimido ou afligido, como ocorreu no cativeiro, mais forte se torna);
- O Marór, uma erva amarga, também no centro da bandeja, que simboliza o sofrimento dos escravos judeus. Pode ser usada qualquer verdura bem amarga;
- O já citado Charoseth, uma mistura de nozes, amêndoas, tâmaras, canela e vinho, colocada na parte inferior, à direita da bandeja. Representa a massa de argila com a qual os judeus escravos trabalhavam na construção das obras dos egípcios;
- O Karpás, um aipo (ou salsão) posto embaixo, à esquerda. Molhado em vinagre ou salmoura, lembra o hissopo (Ezov) com o qual os israelitas aspergiram um pouco de sangue nos batentes de suas casas, antes da praga dos primogênitos;
- O Chazéret, uma porção de escarola, colocada sob o Marór;
- Também coloca-se na mesa um recipiente com água salgada, em que se mergulham as verduras, lembrando o mar, e uma taça para cada um dos presentes.
Cada alimento do Sêder é consumido seguindo-se uma ordem pré-estabelecida, com suas respectivas orações, agradecendo a Deus pela libertação de seu povo.
Conexão com a própria história
O chefe da família respondia a perguntas feitas pelo membro mais novo da mesma a já ter entendimento, capaz de falar. O pequeno indagava, após ensaio, sobre as principais passagens da saída do cativeiro egípcio, em uma espécie de entrevista, e o “entrevistado” contava toda a história, com a atenção de todos os presentes. Graças eram dadas a Deus com taças (sempre novas) de vinho, e o pão ázimo era a única coisa comida na semana seguinte (a Festa dos Pães Ázimos) – o costume mudou para algumas correntes judaicas, e alguns evitam somente o fermento, não restringindo tanto a dieta.
Hoje, os judeus que não têm tempo para fazer os pães ázimos costumam comprá-los prontos, geralmente de padarias, mercearias e supermercados devidamente certificados pelos rabinos. Em Israel e em comunidades judaicas ao redor do planeta, judeus pobres recebem as cestas de Pessach, para que não fiquem sem realizar a ceia. Também é comum que os primogênitos jejuem na véspera do Sêder, lembrando os filhos poupados na praga egípcia. Os alimentos fermentados podem ser guardados, ao invés de jogados fora, como se, simbolicamente, tivessem sido vendidos a não judeus – e após as festas, podem ser consumidos normalmente.
O principal intuito da festa, além da adoração a Deus, é religar o povo judeu todos os anos à sua própria história, sua liberdade. No âmbito cristão, a liberdade também dá o tom: Jesus, ressuscitado, libertou aqueles que estavam em poder do pecado, desligados de Deus.

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